Governo conduz à bancarrota o Regime Próprio de Previdência Social – RPPS

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Os aposentados e os pensionistas do Regime Próprio de Previdência dos Social dos Servidores da União – RPPS, estão sob ameaça de extinção desse regime previdenciário e de deterioração do valor dos seus proventos por causa dos contínuos ataques do governo federal à viabilidade econômica do RPPS.

Está em curso um drástico e sistemático encolhimento do volume de contribuintes para o RPPS em decorrência de decisões governamentais visando extinguir cargos vagos; não realizar concursos para nomeações de novos servidores; substituir servidores efetivos por pessoas contratadas temporariamente e vinculadas ao Regime Geral de Previdência Social – RGPS; disseminar o uso de terceirizações; dar preferência ao atendimento ao cidadão por meio virtual; robotizar os processos administrativos, dentre outras medidas direcionadas a reduzir gastos com a folha de pagamento a qualquer custo, inclusive com a substituição dos servidores pelo uso da inteligência artificial.

Aliado a isso, há também pelo estímulo dado pelo próprio governo federal para os servidores ativos migrem suas contribuições para o Regime de Previdência Complementar – RPC (Funpresp), esvaziando ainda mais intensivamente o RPPS.

Todos esses fatores levam, consequentemente, à redução da estimativa e de realização de receitas previdenciárias, comprometendo o equilíbrio atuarial do RPPS. Isso poderá justificar, em breve tempo, a extinção do RPPS, com base no § 22, do art. 40 da Constituição Federal e art. 34 da Emenda Constitucional nº 103, de 2019.

Os servidores aposentados e os instituidores de pensão e seus respectivos pensionistas contribuíram e contribuem para o RPPS mas, devido ao fato de já terem implementado todas as contribuições e/ou condições necessárias à fruição do benefício previdenciário de aposentadoria ou pensão, não tem a possibilidade de optarem outro regime previdenciário. E para os que estão prestes a serem aposentados não seria vantajosa a migração para o RPC devido ao volume de contribuições já realizadas para o RPPS.

A questão não é obstar o direito de os servidores ativos optarem por outro regime previdenciário diferente do RPPS, mas alertar para a imprudência, a desfaçatez e a irresponsabilidade com que o governo federal vem tratando o RPPS e seus contribuintes, abandonando-os à própria sorte, uma vez que não prevê nenhuma forma de compensação pelo Tesouro Nacional do rombo causado pelo potencial redução de contribuições previdenciárias para o RPPS. Essa redução de receitas, repita-se, é decorrente de crescente diminuição do quadro de servidores efetivos e da evasão de contribuições para o RPC, resultando na deterioração econômica do RPPS, estimulado ou provocado pelo próprio governo.

As ações que provocam encolhimento do volume de contribuições para o RPPS deveriam vir acompanhadas de uma compensação para evitar o seu desequilíbrio econômico, financeiro e atuarial, por uma questão de visão de futuro, responsabilidade e comprometimento com os seus contribuintes.

Devido a falta de transparência dos dados sobre o volume patrimonial e do cruzamento dos montantes de arrecadação total atual com o pagamento de benefícios concedidos pelo RPPS, não se pode aferir se há ou não desequilíbrio atuarial do RPPS, porém é previsível que sem que haja compensação por parte do governo pelo rombo que vem causando ao RPPS esse regime previdenciário não terá condições pagar os proventos das aposentadorias e pensões, no médio e longo prazo, observando a equivalência das contribuições pagas ao longo da vida funcional de cada contribuinte. A elevação das alíquotas de contribuição previdenciária incidentes sobre os proventos das aposentadorias e pensões não será suficiente para assegurar o equilíbrio atuarial do RPPS.

Para piorar o cenário do RPPS, recentemente, em 17 de março de 2022, a Presidência da República encaminhou o Projeto de Lei do Congresso Nacional nº 02/2022, o qual”altera a Lei nº 14.194, de 20 de agosto de 2021, que dispõe sobre as diretrizes para a elaboração e a execução da Lei Orçamentária de 2022.”  Essa proposição legislativa pode ser acompanhada pelo Portal do Congresso Nacional, no endereço: https://www.congressonacional.leg.br/materias/materias-orcamentarias#2022  .

Um parêntese: essa lei nº 14.194/2021 estabelece as diretrizes para a elaboração da lei do orçamento nacional de 2022, que já foi aprovada, promulgada e publicada.  Em 24 de janeiro de 2022 foi publicada a Lei nº  14.303, que “estima a receita e fixa a despesa da União para o exercício financeiro de 2022”, a dita lei do orçamento de 2022.   Como podem pretender alterar, agora, a lei que serviu como diretriz para a elaboração da lei do orçamento? Situação esdrúxula que a lógica não explica.

Pois bem, dentre tantos dispositivos que se pretende alterar na LDO para 2022, chamo a atenção para a alteração prevista do § 8º, do inciso I, do art. 125 da Lei nº 14.194, de 2021. Antes, vejam o que estabelecem os artigos 124 e 125 da referida lei e como se pretende alterar o art 125:

Lei 14.194, de 20 de agosto de 2021:

“Art. 124. As proposições legislativas e as suas emendas, observado o disposto no art. 59 da Constituição, que, direta ou indiretamente, importem ou autorizem redução de receita ou aumento de despesa da União deverão ser instruídas com demonstrativo do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que devam entrar em vigor e nos dois exercícios subsequentes.

  • 1º O proponente é o responsável pela elaboração e pela apresentação do demonstrativo a que se refere o caput.
  • 2º Quando solicitados por presidente de órgão colegiado do Poder Legislativo, os órgãos dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, o Ministério Público da União e a Defensoria Pública da União fornecerão, no âmbito de sua competência, no prazo máximo de sessenta dias, os subsídios técnicos relacionados ao cálculo do impacto orçamentário e financeiro associado à proposição legislativa, para fins da elaboração do demonstrativo a que se refere o caput.
  • 3º O demonstrativo a que se refere o caput deverá conter memória de cálculo com grau de detalhamento suficiente para evidenciar a verossimilhança das premissas e a pertinência das estimativas.
  • 4º A estimativa do impacto orçamentário-financeiro deverá constar da exposição de motivos, caso a proposição seja de autoria do Poder Executivo federal, ou da justificativa, caso a proposição tenha origem no Poder Legislativo.
  • 5º (VETADO)

Art. 125. Caso o demonstrativo a que se refere o art. 124 apresente redução de receita ou aumento de despesas, a proposta deverá demonstrar a ausência de prejuízo ao alcance das metas fiscais e cumprir, para esse fim:

I – no caso de redução de receita, no mínimo, um dos seguintes requisitos:

…………………………..……

  • 8º O disposto no caput não se aplica:

I – aos impostos a que se refere o inciso I do § 3º do art. 14 da Lei Complementar nº 101, de 2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal; e

II – às hipóteses de transação no contencioso tributário de pequeno valor, nos termos previstos em lei, observado o disposto no inciso II do § 3º do art. 14 da Lei Complementar nº 101, de 2000– Lei de Responsabilidade Fiscal.”

 

Agora observem as alterações que são propostas para o art. 125 da Lei 14.194/2021 no Projeto de Lei nº 02/2022, de iniciativa do Presidente da República:

Projeto de Lei nº 02/2022:

“Art. 125 ………………………………..

I – ………………………………………

  1. a) ser demonstrado pelo proponente que a redução da receita foi considerada na estimativa da Lei Orçamentária, na forma prevista no art. 12 da Lei Complementar nº 101, de 2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal;
  2. b) estar acompanhada de medida compensatória que anule o efeito da redução da receita no resultado primário, por meio do aumento de receita corrente ou da redução de despesa; ou

……………………………………………………..…

  • 8º ……………………………………..

I – aos impostos a que se refere o inciso I do § 3º do art. 14 da Lei Complementar nº 101, de 2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal;

II – às hipóteses de transação no contencioso tributário de pequeno valor, na forma prevista na legislação, observado o disposto no inciso II do § 3º do art. 14 da Lei Complementar nº 101, de 2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal;

III – à redução de tributos incidentes sobre operações que envolvam biodiesel, óleo diesel, querosene de aviação e gás liquefeito de petróleo, derivado de petróleo e de gás natural; e

IV – às proposições legislativas do Poder Executivo que reabrirem o prazo de migração para o regime de previdência complementar de que trata o § 7º do art. 3º da Lei nº 12.618, de 30 de abril de 2012, e reduzirem receita da contribuição prevista no art. 40 da Constituição.

………………………………………………………..”  (NR)

 

A grande novidade é que, apesar de, inegavelmente, haver uma redução de receitas por causa da migração de contribuintes do RPPS para o RPC, se for aprovada a inclusão do inciso IV ao, § 8º, do art. 125 da Lei 14.194, de 2021, o governo federal não estará obrigado a cumprir o que estabelece o caput do art. 124, qual seja: apresentar o demonstrativo do impacto orçamentário-financeiro da redução de receitas do RPPS, resultante das migrações para o RPC, no exercício em que devam entrar em vigor e nos dois exercícios subsequentes.

Disso decorre que não existirá, não será feito, qualquer levantamento de dados quantitativos sobre essa redução de receitas no ano de 2022 e para os dois anos subsequentes. Tais dados poderiam servir como base para se projetar a devida compensação ao RPPS pela evasão de contribuintes e de contribuições para o RPC. Essa proposição legislativa denota a falta de transparência, de comprometimento e de seriedade com o RPPS e com seus contribuintes e beneficiários.

E, pasmem, o governo federal ao apresentar essa proposição legislativa reconhece que o RPPS da União está fadado à falência e afirma que é do interesse público a alteração da LDO para permitir a reabertura do prazo de migração. Que se dane o RPPS e seus aposentados e pensionistas!

Vejam o que consta na justificativa dessa proposição legislativa:

“9. Em relação à migração para o regime de previdência complementar de que trata o § 7º art. 3º da Lei nº 12.618, de 30 de abril de 2012, pretende-se reabrir o prazo de opção pelo Regime de Previdência Complementar. Considerando que o RPPS da União adota o regime financeiro de repartição simples, ou seja, a receita corrente das contribuições dos servidores ativos mantém o pagamento dos benefícios correntes, e que se está diante da diminuição de ativos e do aumento substancial de aposentados e pensionistas, considera-se de interesse público a alteração da LDO-2022 para possibilitar a reabertura do referido prazo.

  1. O Projeto prevê ainda correção formal dos arts. 125 e 127 da LDO-2022, para compatibilizar os termos utilizados em todo o Capítulo IX, que trata da adequação orçamentária das alterações na legislação. Como a LDO trata de redução de receita em sentido amplo, e não apenas de “renúncia” nos termos do § 1º do art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal, pretende-se substituir o vocábulo “renúncia” por “redução de receita”. Importante destacar que o texto da LDO-2021 já trazia essa correção, porém a LDO-2022 ficou com a redação inadequada.”

Estamos presenciando o governo federal articular, escancaradamente, a inviabilização e a extinção do Regime Próprio de Previdência Social dos Servidores, o RPPS. Não haveria mal nisso se não houvesse intencionalidade de ignorar, de desonerar-se de obrigações junto àqueles que contribuíram para esse regime previdenciário e está aposentado ou prestes a se aposentar e se também fossem preservados direitos adquiridos pelos aposentados e pensionistas.

A Emenda Constitucional nº 103, de 2019 previu, no art. 149, a instituição de contribuição previdenciária extraordinária incidente sobre as aposentadorias e pensões, cumulativamente com as contribuições ordinárias, com a finalidade de equacionar déficit atuarial.  Mas o que está a olhos vistos é uma sequência de ações do próprio governo federal que fatalmente produzirá um crescente e irreversível déficit atuarial no RPPS. Confiscar uma parcela dos proventos de aposentadorias e pensões, sob a forma de contribuições previdenciária ordinária e extraordinária para pagamento desses mesmos benefícios, além de injusto, não será suficiente para equilibrar as contas do RPPS.

Não se trata aqui de defender entraves para os servidores fazerem a migração do Regime Próprio de Previdência Social para o Regime de Previdência Complementar, mas  destacar o quanto o próprio governo federal está inviabilizando o equilíbrio atuarial do RPPS, sinalizando um futuro incerto e depauperado para os seus contribuintes. Mais ainda, o governo federal está liquidando o RPPS da União e promovendo um verdadeiro calote aos seus contribuintes, que já foram aposentados ou prestes a serem aposentados, assim como aos beneficiários de pensão.

Portanto, é chegada a hora de os contribuintes do RPPS da União, inclusive os aposentados e os pensionistas, tomarem consciência de que o pagamento dos seus benefícios previdenciários está fortemente ameaçado. Precisam unirem-se nacionalmente para forçar um diálogo com o governo federal e buscar assegurar que seus proventos, atuais e futuros, sejam garantidos, sem corrosão do seu valor real, ou seja, mantendo a equivalência das contribuições havidas ao longo de sua vida funcional, independente da coexistência do Regime de Previdência Complementar. A possibilidade de interpelação judicial também não pode ser ignorada.

O tempo é de combate. Aposentados e pensionistas, precisam urgentemente retomar as trincheiras da defesa dos seus direitos e efetivamente participarem das lutas sindicais gerais e específicas.

 

ZENEIDE ANDRADE DE ALENCAR, Analista Judiciária aposentada do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul e Coordenadora Administrativa do SINDJUFE/MS

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Artigos assinados são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam, necessariamente, as ideias ou opiniões do SINDJUFE/MS.

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