Por Charles Bruxel
Coordenador da Fenajufe
Como todos possivelmente sabem, quem entrou antes de 2013 tem direito à aposentadoria integralmente pública. Contribui-se sobre toda a remuneração e o cálculo da aposentadoria e, ainda que indiretamente, da pensão vai levar em conta toda a remuneração sobre a qual incidiu contribuição previdenciária.
Existe, como todos também provavelmente já notaram, até o dia 30/11/2022, a possibilidade de migração para o regime de previdência complementar, no qual a parte pública da aposentadoria fica limitada ao valor-teto do regime geral de previdência social (RGPS), hoje em R$7.087,22 (esse valor é reajustado anualmente pelo INPC).
Na hipótese de migração para a o regime de previdência complementar, quem recebe acima do teto do RGPS, caso da imensa maioria dos servidores do judiciário federal, terá a aposentadoria ficará composta então, via de regra, pelo teto do RGPS, mais um BE – Benefício Especial (espécie de benefício compensatório pela migração de regime corresponde a uma fórmula de cálculo que leva em conta tudo que o servidor contribuiu acima do teto do RPGS antes de migrar).
Ressalva-se que, se a pessoa se submete à regra de cálculo de aposentadoria da média de todos os salários-de-contribuição e trabalhou parte da vida em outros cargos de remuneração inferior ao teto do RPGS, a parte pública da aposentadoria, nesse regime de previdência complementar, poderá ser inferior ao teto do RGPS.
O benefício especial, segundo os parâmetros legais esclarecedores trazidos pela Lei 14.463/2022, não está sujeito à contribuição previdenciária e ficará sendo atualizado pelo mesmo índice aplicável ao benefício de aposentadoria ou pensão mantido pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Ou seja, mesmo que a gente não tenha reajuste, o BE, que só será efetivamente usufruído quando da aposentadoria, ficará sendo reajustado anualmente.
Para os servidores que ainda precisarão trabalhar um bom tempo para se aposentar, é natural que o benefício especial tenha um valor reduzido, de modo que haverá uma terceira parte da aposentadoria que terá que ser composta por: (i)reservas construídas por investimentos do próprio servidor; (ii)benefício previdenciário que será construído a partir do saldo que o servidor acumular de contribuições para o Funpresp-Jud.
Destaca-se que a migração para o regime de previdência complementar é diferente da adesão ao Funpresp-Jud. A pessoa pode migrar sem aderir ao Funpresp.
Conclusões Preliminares
– A decisão é mais fácil para o servidor que está relativamente próximo de se aposentar, pois basicamente ele continuará com uma aposentadoria integralmente pública, formada pelo teto do RGPS (regra) mais o benefício especial (que tende a ter um valor elevado). Para quem está na iminência de se aposentar, a soma dessas parcelas às vezes até supera o valor de aposentadoria que seria obtido por meio da aplicação da regra da integralidade. Destaque-se que quem está na iminência de se aposentar possivelmente não vai se interessar pelo Funpresp, pois não vai dar tempo de construir uma reserva lá que resulte em algum valor significativo;
– A decisão é mais difícil para o servidor que está mais distante de se aposentar, pois o valor do seu benefício especial tende a ser baixo, de modo que ele precisará construir uma terceira parcela de aposentadoria, normalmente pelo Funpresp (para mim é a única forma de construir essa terceira parcela e mais adiante eu explico o motivo).
Quais os riscos de ficar no regime de previdência pública? Quais as vantagens de migrar para o regime de previdência complementar?
Os riscos são muito bem exemplificados pela Reforma da Previdência de 2019: pagar contribuições cada vez mais elevadas, tanto na atividade, quanto na inatividade, e se submeter a regras cada vez mais duras que rebaixam o valor da aposentadoria, principalmente para quem entrou no serviço público entre 2003 e 2013, e das pensões.
Como quem entrou após 2013 já está compulsoriamente no regime de previdência complementar, como existem movimentos temporários de migração voluntária para o regime de previdência complementar e como a própria admissão de servidores têm sido reduzida, a tendência é que o regime público acabe entrando em nova situação deficitária e passe por uma nova rodada de mudanças como as indicadas no parágrafo anterior.
Há, também, o risco de o regime próprio de previdência pública ser totalmente extinto, com todos os servidores sendo migrados forçadamente para o RGPS. Trata-se de hipótese bastante remota e que não se confunde com a migração para o regime de previdência complementar. Mas, em termos práticos, essa migração forçada para o RGPS terá obrigatoriamente a apuração de uma parcela compensatória (algo similar ao benefício especial), porém ninguém sabe qual a fórmula que virá a ser adotada, mas, provavelmente, será pior do que a fórmula de cálculo do BE oferecida nessa janela de migração.
Inclusive, além desses riscos mais genéricos, é importante pontuar que, quem não migrar nessa janela até 30/11/2022, submeter-se-á a uma fórmula de cálculo significativamente pior para apuração do benefício especial, caso queira migrar em uma janela futura. É isso que consta no art. 3º, §2º, I e II, da Lei 12.618/2012, com redação dada pela Lei 14.463/2022.
Uma das vantagens de migrar para o benefício de previdência complementar é não se submeter, na atividade ou na inatividade, à contribuição previdenciária pública incidente sobre a parte remuneratória que excede o teto do RGPS. Em termos práticos, quem migrar e for receber o teto do RGPS + o BE, se livrará totalmente da contribuição previdenciária sobre o que excede o teto do RGPS, enquanto o servidor que for contribuir para o Funpresp-Jud pagará alíquotas menores, na atividade, sobre a parcela remuneratória que excede o teto do RGPS (contribuição para o Funpresp-Jud, com alíquota de até 8,5%) e não pagará contribuição sobre o que excede o teto do RGPS na inatividade.
Quais as vantagens de se manter no regime de previdência pública?
A garantia de contar com uma aposentadoria integralmente pública passa segurança e a ideia de solidez para as pessoas, mesmo que exista a possibilidade de reforma do regime, de tempos em tempos.
Para aqueles que necessitarão aderir ao Funpresp-Jud, existem alguns possíveis prejuízos em relação a alguns benefícios:
– O cálculo da aposentadoria de invalidez depende da reserva acumulada na conta individual do servidor no Funpresp, ou seja, quem sofrer um infortúnio poderá ter um severo prejuízo na renda;
– O valor da pensão por morte do servidor ativo também vai depender do saldo existente na conta individual do servidor, podendo resultar em valores muito pequenos;
– O servidor ou pensionista terá uma redução do valor do benefício quando extrapolado o prazo de sobrevivência inicialmente estimado;
Esses problemas, em tese, podem ser significativamente mitigados com o pagamento de um seguro de cobertura adicional para invalidez e morte por meio de uma seguradora que fez um contrato com valores “razoáveis” com o Funpresp-Jud: https://www.funprespjud.com.br/car/#coberturariscomorte
Com o aumento da quantidade de servidores e contribuições para o Funpresp-Jud, em tese é possível que a condição de pagamento desses benefícios melhores. Exeplificativamente, o regulamento do Funpresp-Exe é bem melhor, em relação ao valor desses benefícios.
Devo aderir ao Funpresp-Jud?
Por mais que o plano de benefícios do Funpresp-Jud não seja perfeito, a maioria dos planos de previdência privada sequer oferecem um plano com cobertura decente para situações como invalidez, por exemplo. Invalidez ou morte geralmente são tratadas por meio de seguros de vida.
Independentemente disso, a questão que faz toda a diferença é a contrapartida da União, equivalente à contribuição que o servidor fizer para o Funpresp-Jud. Em apertada síntese, a cada R$1,00 que o servidor contribui para o Funpresp-Jud, uns R$0,82 vão para a conta individual do servidor, indo o resto para custear benefícios extraordinários e para custear administrativamente o fundo. A União coloca a contrapartida dela de R$1,00 para cada R$1,00 que o servidor contribui, que passa pelo mesmo processo (ou seja, somente R$0,82 entram na conta individual do servidor). O resultado final é que o servidor terá pagado um real e terá R$1,64 em sua conta individual (rendimento imediato de 64%). Esse valor ainda vai ser investido e vai retornar, pelo menos, a inflação do período (o Funpresp-Jud tem rendido acima da inflação, mas vamos abstrair), mas vamos abstrair esse ponto. Esse valor, quando a pessoa se aposentar, caso escolha a tabela regressiva de imposto de renda, se submeterá provavelmente a uma alíquota de imposto de renda de 10%. Nessa abstração, concluímos que o servidor terá contribuído com 1 real e irá receber R$1,476.
Caso a pessoa resolva pegar o dinheiro e investir, ao invés de contribuir para o Funpresp, ela irá, de cara, pagar a alíquota de 27,5% de imposto de renda. Ou seja, a cada R$1,00 a mais que ela pretende receber para investir e construir a terceira parte de sua aposentadoria, ela receberá líquido R$0,725. Supondo que não vá haver mais incidência de imposto de renda sobre os rendimentos (o que é mentira, mas tudo bem), a pessoa teria que obter um rendimento de mais de 100% só para empatar com o que ela terá obtido no funpresp logo na partida. A cada mês a pessoa teria que desesperadamente buscar investimentos de alto risco para tentar empatar com o funpresp.
Em resumo, quem vai precisar de uma terceira fonte para integralizar a aposentadoria, deve sim aderir ao Funpresp-Jud. É a única maneira viável de construir essa terceira fatia.
Existem potenciais riscos no Funpresp-Jud? Sim, tudo que depende de lei pode mudar.
Mas o Funpresp-Jud é relativamente blindado a gestões completamente amadoras e a prejuízos absurdos pelo simples fato de ter dinheiro da magistratura também nesse fundo. Ninguém quer arranjar problema com os magistrados, né? E eles também não podem ter um fundo autônomo, pois esses fundos dependem de uma larga escala para serem viáveis, principalmente na parte de cobertura de benefícios por infortúnios.
Inclusive, destaco que o Conselho Consultivo do Funpresp-Jud é composto por seis membros, 3 indicados pela Administração e 3 eleitos pelos participantes/assistidos.
E a contrapartida da União? Pode acabar? Tudo é possível. Mas, sem a contrapartida, o Funpresp perde a viabilidade. Ninguém vai mais se interessar por ele. E isso, além de prejudicar as migrações (que geram economia para a União), vai fazer com que um fundo bilionário seja simplesmente jogado fora, algo que vai contra os interesses políticos.
Afinal, o que fazer?
Primeiro passo é saber o valor do benefício especial.
Segundo passo é fazer simulações no site do Funpresp-Jud.
Terceiro é ponderar os riscos, fazer prognósticos e aceitar os riscos decorrentes de ficar no regime de previdência totalmente pública e de migrar.
Não há receita de bolo, a vantajosidade da migração depende de cada caso e, em muitas hipóteses, da avaliação subjetiva de riscos feita pelo(a) próprio(a) servidor(a).